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Artigos

Mulheres idosas trabalhadoras e seus envelhecimentos e sofreres invisíveis

“A mulher não nasce velha, torna-se velha. E, tornando-se velha não perde sua condição de mulher”.
Isolda Belo

Até 2060, um em cada quatro brasileiras/os será idosa/o. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o tempo de vida ao nascer chegou a 72,7 anos para os homens e 79,8 anos para as mulheres em 2018. Considerando que esse fenômeno é feminino, pois as mulheres vivem em torno de sete a oito anos a mais do que os homens e envelhecem mais depressa, perguntamos, neste dia dedicado à luta das mulheres trabalhadoras, como vivem essas mulheres velhas e o que pensam sobre envelhecer?
Já estamos vivendo os reflexos da Reforma Trabalhista (Lei 13.467 de 13/07/2017) e às vésperas da quase aprovação da Previdência. Esta última prevê a quebra da pactuação do Estado com a sociedade, construída na Constituição de 1988, quando garantia, no Capítulo II – Da Seguridade Social, o tripé Saúde, Previdência e a Assistência Social. Trocando em miúdos, significa que o Estado não mais reconhece como sua responsabilidade a garantia de um conjunto de ações integradas que garantam os direitos a essas três áreas e outras para todas as/os brasileiras/os.

No entanto, já está claro que as mais prejudicadas serão as mulheres, em especial as trabalhadoras rurais, as negras e as que vivem em situação de pobreza. O aumento da idade mínima para conseguir o benefício, por exemplo, faz parecer que não existem diferenças e desigualdades entre as mulheres e os homens, principalmente no ambiente de trabalho. Bem como não dita as condições desse envelhecer, como nos fala a Doutora em Sociologia, Eneida Haddad, “o lugar ocupado pelo trabalho durante a vida produtiva é decisivo na qualidade do fim da vida na velhice” (p.39)

A pesquisa “Mulher Idosa em Pernambuco: empoderamento e seus entraves”, realizada pela Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), em parceria com o Governo de Pernambuco e a Secretaria da Mulher, traz alguns alertas. Numa sociedade como a nossa, ao envelhecer, as mulheres vão perdendo a condição de serem vistas como mulheres, aos olhos da lógica do capital. De um lado, o envelhecimento traz consigo a ideia do fim da vivência da sexualidade e da importância e necessidade da participação política, negada às mulheres velhas, em diversos espaços que não sejam para discussões e cuidados exclusivos para idosas.

Do outro lado, a sociedade continua a cobrar destas velhas a continuidade pela responsabilidade e o compromisso. Não bastasse a vida toda vivida sob as ordens dos pais e depois, dos maridos, o envelhecimento ou a ausência (viuvez) deles transfere para as mulheres a permanência dos cuidados com a casa e a família.
Os últimos Censos Demográficos demonstram o crescente número de lares sob a responsabilidade de pessoas idosas, sobretudo em áreas rurais e que respondem por importante papel na economia local. Também mostram que são as mulheres que são as responsáveis pelo orçamento da casa. No entanto, essa renda feminina (por pensões, Benefício de Prestação Continuada – BPC - ou outros auxílios) é “naturalmente” comprometida com a manutenção dos lares e dos familiares.

Nesse cenário, perguntamos: o que pensam as mulheres idosas sobre o envelhecimento?
A pesquisa, realizada com 4.500 mulheres com mais de 60 anos, de diferentes faixas etárias, das cinco regiões do estado aponta que para 47% das entrevistadas a solidão é a marca do envelhecimento e 28,8% compreendem como um momento de tristeza. Somados, 75,8% das mulheres enxergam como negativa a imagem da velhice contra 23,5% que pensam viver uma boa fase.

A Dra. Isolda Belo, da Fundaj, esclarece que culturalmente as mulheres foram formadas em espaços que negavam sua participação e autonomia e “carregam o traço marcante da submissão, do retraimento, da domesticidade, da inutilidade econômica e da alienação política” e, portanto, suas demandas e necessidades não são consideradas. Logo, como fica a representação dessas mulheres velhas e trabalhadoras diante de um 8 de Março fortemente marcado pela luta da retomada de direitos?

É nesse cenário que este ano as mulheres novamente marcharão até Brasília, dias 13 e 14 de agosto, numa ação solidária exigindo democracia, justiça, igualdade, liberdade e vida digna para todas as pessoas. A Marcha das Margaridas é uma referência à Margarida Alves, fundadora do Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural e Presidenta do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande (PB), assassinada em 12 de agosto de 1983, na frente de sua família, com um tiro no rosto, em luta pelo direito à terra. É uma ação coletiva pensada e organizada pelas mulheres do campo, da floresta e das águas que se tornou uma agenda permanente de lutas dos movimentos sindical, de mulheres e feministas.

Nesse 8 de Março, por que marcham as mulheres trabalhadoras velhas?

Rosely Arantes
Jornalista e Assessora da Diretoria de Políticas para a Terceira Idade Idosos e Idosas Rurais da Fetape

Referências
BELO, Isolda. Velhice e mulher: vulnerabilidades e conquistas. Feminismos, Salvador, v. 1, p.1-20, dez. 2013. Quadrimestral. Disponível em: <http://www.feminismos.neim.ufba.br/index.php/revista/article/viewFile/84/82>. Acesso em: 01 mar. 2019.

BELO, Isolda (Org.). Velhice da Mulher. In: JOICE SOUZA COSTA [ET AL.] (Franca) (Org.). Aproximação e Ensaio sobre a Velhice. São Paulo. 2017. Cap. 7. p. 120-134. Disponível em: <http://www.upe.br/images/aproximacoes_ensaios_sobre_velhice.pdf>. Acesso em: 01 mar. 2019.

HADDAD, Eneida Gonçalves de Macedo. A Ideologia da Velhice. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2016. 206 p.

 

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